Há cerca de três anos, no Clube do “Cantinho da Leitura”, enquanto corrigia alguns trabalhos sobre actividades lá desenvolvidas, um aluno sugeriu: “- Professora, somos sempre nós a escrever para si! Escreva, também, alguma coisa para nós…” Os outros aliaram-se à sugestão e reforçaram o pedido num coro vigoroso. Eu sorri, um pouco admirada com a ideia, e concordei vagamente: “- Sim, talvez, um dia…”
Já em casa, os seus olhinhos brilhantes e expressivos, as suas vozes doces, as suas expressões acompanhavam-me e não abandonavam o meu pensamento. Peguei numa caneta e deixei que os meus sentimentos e pensamentos saltassem para o papel vestidos de palavras.
Na próxima sessão do “Cantinho da Leitura”, anunciei que tinha escrito algo para eles. Olharam-me surpreendidos e ficaram, por momentos, paralisados, calados, aguardando ansiosamente o que se seguia.
“- Fiz o trabalho que me pediram! – disse, não escondendo o carinho – Escrevi estas palavras para vós:”
Olhar o mundo
Com olhos de cristal,
A alma pura,
O coração aberto
E o sonho ali tão perto…
Olhar o céu
E querer o Sol, a Lua,
Galopar nas nuvens
Até além, onde o azul desagua,
Falar com as estrelas
E querer conhecê-las,
Bordar o céu com fantasia,
Brincar na lonjura da praia,
Cheirar a maresia.
Ser criança é…
Caminhar chutando
As pedras de calçada,
Saltar os muros,
Fugir à desfilada,
Chapinhar na água,
Sujar sapatilhas e calções,
Ouvir “sermões”
E ficar sem mágoa.
Ser criança é…
Sorrir, cantar, assobiar,
Pensar as brincadeiras,
Às vezes, fazer asneiras,
Correr até à exaustão,
Escorregar, cair no chão,
Levantar e continuar.
Ser criança é…
Estudar,
Mas também brincar,
Aprender a crescer, a viver, a pensar,
Mas também ensinar.
Ser criança é…
Olhar o mundo com esperança,
Querer ser bailarina, bombeiro,
Aviador, polícia, marinheiro,
Sem qualquer hesitação,
Com alegria e confiança.
É sonhar,
Fazer castelos no ar
E acreditar que amanhã
O Sol voltará a brilhar
E o mundo será seu…
Nunca esquecerei a sua reacção! No final, bateram palmas, com uma alegria incontida, com os olhos brilhantes de emoção e sorrisos que me abraçavam. O que me disseram foi um presente valioso, de facto, um momento inesquecível!
Hoje, quero dedicar estas palavras a todas as crianças, porque penso nelas com um carinho muito especial. Gostaria, também, de as partilhar com os mais “crescidos” para que guardem, dentro de si, um pouco da alma de criança…